As notícias falsas que se espalham rapidamente pela internet e redes sociais, conhecidas como fakeNews têm ganhado certa notoriedade nos debates jurídicos, políticos e sociais.
O assunto é sério: a disseminação de fake News já foi responsável pelo suicídio (ou até mesmo homicídio) de diversas pessoas ao redor do mundo. No Brasil, não tem sido diferente.
Importante então saber como a nossa legislação vem tratando o tema em busca da proteção aos direitos do cidadão, de modo a extirpar (ou amenizar) os efeitos desse mal do mundo moderno.
Notícias falsas (Fakenews) é um neologismo, usado para se referir a notícias fabricadas. O termo Fakenews originou-se nos meios tradicionais de comunicação, tendo chegado à internet mais recentemente.
Embora considerado um neologismo, e tendo se popularizado em 2016 com as eleições americanas, de acordo com o dicionário Merriam-Webster, o termo “fakenews” já existe há mais de cem anos.
Este tipo de notícia, encontrada em meios tradicionais, mídias sociais ou sites de notícias falsas são apresentadas como a absoluta verdade, tendo o condão de denegrir a imagem de um individuo, um determinado grupo, uma instituição, ou o próprio Governo.
São histórias fabricadas do puro ideário humano. De forma geral, criadas deliberadamente e que qualquer definição sejam mentira.” A intenção e o propósito por trás das notícias falsas é importante. Em alguns casos, o que parece ser uma falsa notícia pode ser, na verdade, notícias de sátira, que usa o exagero e introduz elementos não verdadeiros com o objetivo de divertir ou fazer um ponto, em vez de enganar. Propagandas também pode ser falsas notícias.
O Projeto de Lei 6.812/2017, de autoria do deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), pretende instituir como crime a ação de quem “divulgar ou compartilhar, por qualquer meio, na rede mundial de computadores, informação falsa ou prejudicialmente incompleta em detrimento de pessoa física ou jurídica”.
Outro Projeto de Lei em trâmite (473/2017), de autoria do senador Ciro Nogueira (PP-PI), pretende acrescentar ao Código Penal uma nova tipificação de divulgação falsa, consistente em “divulgar notícia que sabe ser falsa e que possa distorcer, alterar ou corromper a verdade sobre informações relacionadas à saúde, à segurança pública, à economia nacional, ao processo eleitoral ou que afetem interesse público”
Analisando exemplos de fakenews já averiguados, é possível perceber um alto grau de compartilhamentos e disseminação da informação cenário mundial.
Mas, e atualmente, o que diz a legislação brasileira?
Em primeiro lugar, imperioso destacar que a Constituição Federal protege a a honra e imagem das pessoas. Vejamos:
Artigo 5° (…)
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Assim, mesmo sendo livre a manifestação do pensamento (artigo 5°, IV da CF), tal ato não poderá representar uma violação a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, sob pena de o responsável ter que pagar indenização por danos morais ou materiais à vitima.
O Código Penal, por sua vez, traz em seu bojo um capítulo dedicado aos crimes contra a honra, sendo eles a calúnia, difamação e injúria, vejamos:
Art. 138 – Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Art. 139 – Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:
Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.
Art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.
A distinção entre os crimes contra a honra se mostra bastante sensível, mas pacificada pela doutrina e jurisprudência Pátria. Assim, se a “fakenews” atribuir falsamente algum ato criminoso a alguém, estaremos diante do crime de calúnia.
Se o fato não for criminoso, mas ofensivo à reputação (Ex: dizer que fulano construiu seu patrimônio desviando dinheiro público, sem especificar exatamente o fato), estaremos diante do crime descrito no artigo 139 do Código Penal.
Lado outro, se a ofensa for à dignidade da pessoa (honra subjetiva), estaremos diante do crime de injúria.
A disseminação de informação capaz de gerar pânico ou desassossego público, por sua vez, é tipificada pelo artigo 30 do Decreto-lei 4.766/42.
Art. 30. Divulgar notícia que possa gerar pânico ou desassossego público.
Pena – reclusão, de seis meses a um ano.
Provocar alarme, anunciar desastre, perigo inexistente, ou praticar qualquer ato apto a produzir pânico são condutas classificáveis como contravenção penal, nos termos do artigo 41 da Lei de Contravenções Penais.
No tocante à responsabilidade civil, quem produz ou compartilha informações falsas pode ser condenado a ressarcir a vítima se houver danos morais ou materiais.
O dano moral é aquele que afeta a personalidade, a moral e a dignidade da pessoa e decorre da própria ofensa, pela força dos próprios fatos. A princípio, não é necessária a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral da pessoa. O próprio fato já configura o dano. Na indenização por dano moral, deve ser analisada a ofensa à honra subjetiva (apreço à própria dignidade) e a honra objetiva (valoração de terceiros, reputação, a boa ou má fama).
Josiele de Abreu Dias, advogada, assim leciona, em artigo de sua autoria:
A reparação civil deverá ser aplicada de forma justa e proporcional, sem gerar enriquecimento ilícito, sobretudo na apuração do dano moral, que deve levar em conta o caráter punitivo/pedagógico da indenização. Para isso, é necessário balancear a situação econômica das partes, o dano sofrido pela vítima de uma notícia falsa e a repercussão dessa publicação em sua vida.
Por fim, concluímos que o tema é delicado e exige profundo e amadurecido debate. Os que defendem a criminalização da criação — e, em alguns casos, da divulgação — das fakenews, sustentam que hoje não existe nenhuma tipificação penal apta a proteger a qualidade e a veracidade da informação veiculada nos mais variados tipos de mídia.
Cremos que a questão é delicada e deve-se observar a extensão do dano causado por aquele que propaga a notícia falsa, para a partir daí definirmos o que pretendemos tutelar. A legislação civil/eleitoral não seria suficiente a regular a matéria?
O princípio da intervenção mínima ensina que o Direito Penal não interferirá excessivamente na vida do indivíduo, a ponto de lhe retirar a autonomia e liberdade, sendo utilizado somente como última ratio.
O Direito Penal nunca será a panaceia e seu uso em demasia pode por em risco a credibilidade (já afetada) das instituições públicas, notadamente o Poder Judiciário e os órgãos de Segurança Pública insculpidos no artigo 144 da Constituição Federal.
De outro norte, o princípio da taxatividade, estabelece que as condutas criminosas devem estar descritas na lei de maneira clara e bem definida, de modo a não deixar nenhuma dúvida, visto que a elaboração de normas penais ambíguas e carregadas de termos valorativos, possibilita o abuso pelo Estado. O legislador deve ter especial atenção ao definir o que será considerado noticia falsa, para que evite abuso pelo Estado, tendo em vista a excepcionalidade do Direito Penal.
JAIRO LIMA.
Formado em Direito pela Faculdade de Ensino Superior de Floriano. Pós graduando em Direito Penal e Processual Penal, pela Uninovafapi. Sócio fundador do Escritório Jairo Lima Advogados Associados. Advogado militante. Atua nas áreas trabalhista, criminal e militar, além de redigir contratos cíveis. Advogado do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Floriano. Presidente da Subcomissão de Relacionamento com o Poder Judiciário da OAB/PI.
http://www.jairolimaadvogados.com.br/index.php/blog/item/34-as-fake-news-e-o-direito-brasileiro
Sérgio Bento De Sepúlvida Júnior
Sócio Administrador e Escritor
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